APRESENTAÇÃO
A Cia. Livre trabalha coletivamente desde 1999, desenvolvendo uma práxis teatral cujo cerne reside na criação de processos de estudo, pesquisa e criação abertos ao público, o que resulta na participação ativa dos espectadores nos seus espetáculos.
Esses "estudos públicos", desde o início do trabalho, tornou-se um procedimento essencial para a criação na Cia. Livre. Através desta "pesquisa estética pública" começamos a "cercar" um tema, através do teatro, mas também com a parceria de pesquisadores de outros campos das ciências humanas, principalmente a antropologia e a história, mas também a geografia e a medicina. E a partir de um certo momento de nossa prática, a pesquisa teórica e cênica, passou a contar com a pesquisa de campo e, a partir daí, o contato humano e a comunicação com as pessoas em cada passo do fazer teatral, torna-se uma práxis seminal do trabalho. Desta forma, o posicionamento social e político de cada trabalho - o "por quê" fazemos o que fazemos e como fazemos, com quem e para quem - advém da relação direta com segmentos específicos da sociedade brasileira, através de estudos públicos e pesquisas de campo.
Estudar e conhecer para devorar (ou ser devorado) publicamente, para refletir o nosso próprio tempo histórico, junto com uma plateia participante. É pesquisa em artes cênicas, mas também é uma forma de ação estética e política.
O ENCONTRO, primeiro teórico, depois humano, com os povos indígenas, alguns entre os múltiplos povos originários dessa terra, suas culturas complexas e cosmologias outras, seu modo comunitário de fazer e viver, gerou uma reviravolta no trabalho e na forma de existência da Cia. Livre, uma transformação ou deslocamento fundamental do nosso ponto de vista. Mudou a nossa forma de ver, de ser e fazer teatro. Ainda precisamos aprender a escutar melhor suas palavras...
Esse modo de fazer, construído por múltiplos artistas, amigxs e parceiros em companhia, em 21 anos de estrada, propõe uma relação direta entre a pesquisa, a pedagogia e a prática teatral, como ação política e social.
É o que podemos fazer… e o que devemos fazer, enquanto dura.
É nossa responsabilidade como artistas e como seres viventes deste planeta global, em 2021, aqui e agora. Estamos em uma encruzilhada da história, tempos de "fim de mundo" ou começo de outro. Onde tudo pode mudar ou o céu pode cair sobre nossas cabeças. Escolhemos agora, como muitos e muitas de nós, dançar e contar histórias para o céu não cair.
21 ANOS DE VIDA
Na primeira fase de nossas pesquisas estudamos o realismo em confronto com o épico na dramaturgia nacional, com o Estudos Público das Tragédias Cariocas de Nelson Rodrigues, que deu origem aos espetáculos Toda Nudez Será Castigada, (2000/02) e Os 7 Gatinhos (2000/2001) e na dramaturgia mundial, no espetáculo Um Bonde Chamado Desejo (2002) e Projeto Kroetz [O Ninho, Alta Áustria e Depois do Expediente] (2003).
Em 2004 a Cia. Livre ocupa o Teatro de Arena no ano de seu cinquentenário,... Falta um parágrafo sobre o Arena, Buscar.
Desde 2006 a Cia. Livre trabalha na fronteira com a antropologia, realizando estudos teóricos e pesquisa de campo entre povos indígenas brasileiros, resultando em processos colaborativos de criação de texto e cena a partir de cosmologias e narrativas ameríndias. O estudo público “Mitos de Morte e Renascimento [Povos Ameríndios]”, dá origem ao premiado espetáculo VEM VAI - O Caminho dos Mortos (2006/09), dramaturgia de Newton Moreno em processo colaborativo com a Cia.Livre, a partir de narrativas de morte dos povos Araweté, Juruna/Yudjá, Jívaro, Marubo, Kaxinawá, Tupinambá, Yekuana e Wayãpi.
A Antropofagia vira tema e procedimento de trabalho, gerando uma linguagem épica brasileira, a partir da releitura do conceito de Perspectivismo Ameríndio. Em 2009, realiza o Estudo Público Teatro e Rito, que dá origem à peça Raptada pelo Raio (2009/11) livre recriação do antropólogo Pedro Cesarino, de mitos do povo Marubo. A pesquisa “Do mato ao Asfalto (2014/15), origina os espetáculos Cia.Livre Canta Kaná Kawã e Maria que virou Jonas. Em 2014, a Cia.Livre recebe o Certificado de Patrimônio Cultural Imaterial da Cidade de São Paulo. Em 2017, o grupo inicia o projeto Revoltare, com 5 leituras encenadas de textos de Brecht, além da estreia de Revoltar, de Dione Carlos. Em 2018 a diretora Cibele Forjaz realiza um pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da USP, com uma travessia de um ano pelo Rio Xingu, da Foz às cabeceiras, com estudo de campo entre os povos Araweté, Juruna, Kayapó-Mebengokré, Kamayurá e Yudjá. A partir dessa experiência, a Cia.Livre cria o espetáculo Os Um e Os Outros, livre adaptação de Os Horácios e os Curiácios, de Bertolt Brecht, sobre a luta de resistência dos povos ameríndios contra o desmonte das políticas indigenistas e ambientais no atual governo. Esse espetáculo foi realizado também a partir de pesquisa de campo coletiva junto ao povo Guarani M’Bya.